Autor: Gabriel Luís Gajardo, acadêmico de nutrição do Centro Universitário Unigran Capital.
A pluralidade das conformações familiares na sociedade contemporânea inclui
arranjos que fogem à normativa cisheterossexual, como é o caso das famílias formadas
por pessoas LGBTQIAP+. Nesse contexto, a parentalidade, inclusive por meio da
gestação natural, adoção ou técnicas de reprodução assistida, tem se mostrado um
fenômeno em ressignificação constante. Entretanto, homens trans que optam pela
gestação e lactação enfrentam desafios significativos, tanto no acesso aos serviços de
saúde quanto na prática da amamentação, especialmente após a realização de
mastectomia.
O acesso à saúde para pessoas trans, incluindo homens trans, é marcado por
barreiras significativas. A cisheteronormatividade profundamente enraizada nas
instituições de saúde molda comportamentos e expectativas que resultam em
preconceito e marginalização. Muitos profissionais de saúde não estão adequadamente
preparados para atender as especificidades da população trans, o que se reflete na falta
de conhecimento sobre a amamentação em homens trans e na utilização de linguagem
inadequada que causa desconforto.
Um exemplo claro desse despreparo é a utilização de pronomes e termos
cisnormativos por profissionais de Banco de Leite Humano (BLH), que continuam
referindo-se a homens trans como "ela", "mãe" e utilizando o termo "leite materno".
Essas microagressões, embora muitas vezes não intencionais, têm um impacto profundo
na experiência dos homens trans, gerando sentimentos de exclusão e desrespeito à sua
identidade de gênero.
Um dos desafios específicos enfrentados por homens trans que gestam é a
lactação após a mastectomia. A mastectomia, cirurgia comum entre homens trans para a
remoção dos seios, pode complicar a capacidade de lactar. Embora a produção de leite
ainda seja possível em alguns casos, a ausência de tecido mamário suficiente e a
interrupção dos ductos lactíferos podem dificultar o processo.
Adicionalmente, o uso de testosterona, um hormônio frequentemente utilizado
por homens trans, pode afetar a lactação. A retomada da testosterona após o parto pode
levar à cessação da produção de leite, uma vez que os efeitos hormonais podem
influenciar negativamente na lactação. Apesar de relatos esparsos de homens trans que
continuam a lactar enquanto utilizam testosterona, não há evidências suficientes sobre a
segurança desse processo para a saúde do bebê.
A falta de conhecimento e preparo dos profissionais de saúde em relação à
população trans é uma barreira significativa ao atendimento adequado. As ementas
curriculares dos cursos de saúde, incluindo enfermagem e medicina, raramente
contemplam de maneira aprofundada a saúde da população trans, resultando em
profissionais despreparados para lidar com as necessidades específicas desses
indivíduos.
Capacitar os profissionais de saúde para que compreendam e respeitem as
especificidades dos homens trans, incluindo o uso adequado de pronomes e termos
neutros, é essencial para melhorar o atendimento. A implementação de políticas de
educação permanente em saúde que incluam temas relacionados à diversidade de gênero
pode contribuir para a criação de um ambiente mais inclusivo e acolhedor.
Fonte: https://www.scielo.br/j/csc/a/bjfNmV8yxsGKc7P5r7LZRdk/# &
inducao-de-lactacao-ameaca-paradigmas-de-genero,90e460cc787a8a67b55af65e3a0735c5d2pra07r.html
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